quinta-feira, dezembro 07, 2006
O Esquife
Parei por um momento o meu café e corri para o jardim.
Eram oito horas da manhã, e eu ainda nem havia tirado o pijama. Foi a primeira cena verdadeiramente marcante que registrei na nova cidade: exatamente quatorze pessoas, todas negras, empurrando uma estrutura metálica com rodas de bicicleta que por sua vez sustentava um enorme caixão sem muitos ornamentos. À frente, um dos seguidores levava a coroa de flores, que assim como a caixa do defunto não era lá essas coisas. Ninguém aparentava tristeza ou desolamento, estavam todos voltados para a vida, absortos e confiantes na vida. Apenas uma velha senhora que se escorava num rapaz parecia andar com dificuldades, mas talvez fosse coisa da idade mesmo.Deduzi que pudesse ser a viúva. Sim, porque pelo tamanho do objeto de madeira imaginei que só poderia estar guardando o corpo de um homem, e pela feição dos que o levavam sua morte não foi tão inesperada, portanto, deveria ser mesmo um homem velho.
Aos passos largos e apressados o enterro foi deixando minha rua. Os vizinhos e os sabiás quebraram o silêncio voltando à agitação feroz e sem finalidade que é a vida.
Para minha surpresa, vim saber mais tarde que a matéria que passava era de fato de um senhor negro, alto de quase noventa anos conhecido por seu Manuel, que ao contrário do Bandeira, estava liberto para sempre da alma extinta.
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