terça-feira, janeiro 27, 2009

Carta de despedida ao trema

Carta de despedida...

Como outros já fizeram, quero também me despedir do trema, cuja morte foi anunciada por decreto a partir de 1º de janeiro. Não uma, mas cinqüenta e cinco vezes quero me despedir desta acentuação antiqüíssima e usada com tanta freqüência.
Fomos argüídos a respeito? Claro que não!
A ambigüidade que tínhamos para decidir se queríamos usar o trema ou não numa frase nos foi seqüestrada para sempre. Afinal, a ubiqüidade do trema nunca nos foi exigida. Quem deve se beneficiar com esta tão inconseqüente medida?
Creio que tão somente os alcagüetes, os delinqüentes e os sangüinários, justamente aqueles que não estão eqüidistantes, como nós, dos valores eqüiláteros da Sociedade. Vocês já se argüiram sobre as conseqüências do fim do trema para os pingüins, os sagüis e os eqüestres? Estes perderão uma identidade conquistada desde a antigüidade.
E o que dizer do nosso herói Anhangüera, que vivia tranqüilo com o seu nome indígena? Com a liqüidação do trema, a pronúncia do seu nome não será mais exeqüível. Os nossos papos de chopp nunca mais serão os mesmos, pois a tão freqüente lingüicinha acebolada vai desagüar num sangüíneo esquecimento.
O que vai acontecer com o grão de bico com gergilim, agora sem o liqüidificador para prepará-lo? Ah, meu Deus! Tenha piedade de nós!
Nunca mais poderemos escrever que "a última enxagüada é a que fica"! Não sei se vou agüentar a perda da eloqüência, em termos de estilo literário, que o trema trazia à Última Flor do Lácio.
É preciso que averigüemos se haverá seqüelas futuras!
E para onde vai a grandiloqüência dos lingüistas?
Haja ungüento para suportar tamanha dor!
O que podemos esperar em seqüência? Será que não se poderia esperar mais um qüinqüênio para que fossem melhor avaliados os líqüidos benefícios desta mudança? Portanto, pela qüinqüagésima vez, a minha voz exangüe se une à dos bilíngües e trilíngües como eu, cuja consangüinidade lingüística e contigüidade sintática se revolta ante tamanha iniqüidade.
Pedir que nos apazigüemos, para mim é inexeqüível, pois falta-nos tranqüilidade diante de tamanha delinqüência gramatical. Portanto é com dor no coração que lhe dou este meu adeus desmilingüido, mas pelo menos uma coisa me apazigüa, pois quando a saudade bater, sei que vou poder revê-lo quando estiver lendo alguma coisa em alemão.
Adeus, meu trema querido!

2 comentários:

Luis disse...

Olá!

Nós em Portugal já não utilizava-mos o trema.
Agora em relação ao acordo, ao início estava um pouco reticente mas agora já estou muito mais esclarecido, achando que é uma boa iniciativa, mas que certamente irei continuar a escrever como até aqui. Hábitos!

Tudo de bom!

Neusinha Pavarotti disse...

Bom, nunca foi amiga do trema. Se é a pronúncia o que leva ao acento, ele é dispensável. Não pegamos intimidade. Vai tarde!